terça-feira, 29 de junho de 2010

Vazamento mudará economia do petróleo

Os sinais são claros, embora as ações sejam ainda fracas. O vazamento do Golfo vai afetar de forma durável a economia do petróleo. A opinião é de Sérgio Abranches e publicada em seu blog, 17-06-2010.
Eis o artigo.
Os danos do vazamento como já se sabe são extensos e se propagarão por décadas. Os efeitos econômicos são importantes e também de médio prazo no mínimo: perda de atividade econômica na região do Golfo; pescadores mergulhando na pobreza, diante do colapso da pesca; receitas do turismo despencando; altos custos de indenizações e pagamentos de seguros.
Mas a própria indústria do petróleo não ficará livre de repercussões de curto, médio e longo prazo em sua economia. Os impactos de curto prazo são claros: a BP perdeu 40% do seu valor de mercado e tem sua sustentabilidade como empresa em dúvida. Nas principais bolsas do mundo, as ações de empresas direta ou indiretamente ligadas à exploração de petróleo offshore viram suas ações caírem muito.
Na City de Londres, o estrago foi maior: muitos fundos de investimentos têm participação relevante de papéis da BP em seus portfólios. Perderam muito e não têm muito o que fazer. Se venderem as ações agora, realizam um enorme prejuízo. Se esperarem elas se revalorizarem, assumirão o risco BP por um período ainda mais longo e podem não recuperar todo o valor perdido.
No médio prazo, a principal questão é o valor real dos custos finais de limpeza das águas e costas do Golfo, das reparações por perdas e danos, e das limitações à exploração de petróleo no mar. Especula-se, no momento, diante da elevação da estimativa do volume do vazamento de 35 milhões de barris/dia para 60 milhões de barris/dia, que só a limpeza deverá ultrapassar os US$ 60 milhões. O fundo de US$ 20 bilhões criado por acordo entre o governo Obama e a BP não dará nem para o começo.
Alguns analistas falam, hoje, em no mínimo US$ 60 bilhões, para cobrir os custos de limpeza e as indenizações. Mas esse valor pode subir todo dia. Como disse um ambientalista que está envolvido no salvamento da vida silvestre afetada: cada dia é um dia diferente e tem sido impossível prever que sustos novos teremos no dia seguinte.
E tudo dependerá, ainda, de quando o vazamento será definitivamente interrompido. O gestor de um fundo britânico, que tem 4% de seus ativos em papéis da BP, diz que carregará o risco BP e espera que “em algum momento até o final deste ano, o vazamento seja estancado”.
As consequências de longo prazo é que são mais importantes e positivas, na sua maioria. A primeira delas, já em curso no EUA, mas em estudo em todo o mundo – menos no Brasil, diga-se de passagem – é a reestruturação do marco regulatório para esse tipo de exploração. Tanto as regras, quanto a governança regulatória da exploração no mar (offshore) vão mudar.
No Estados Unidos, enquanto o Congresso começa a analisar um novo marco legal, Obama determinou uma moratória de seis meses na exploração no mar e interveio na agência que regula essas atividades, o Minerals Management Service. Demitiu todas as chefias importantes e dividiu a agência em três departamentos.
O Bureau of Ocean Energy Management cuidará da exploração de petróleo e gás na plataforma continental (Outer Continental Shell) e do licenciamento de projetos de energia, inclusive renovável; o Bureau of Safety and Environmental Enforcement será responsável pelas ações de comando e controle; e o Office of Natural Resources Revenue coletará os royalties.
A Noruega também interrompeu a exploração no Mar do Norte, para reavaliar os riscos e, certamente, adotará novas regras. A indústria de seguros será forçada a adotar novos procedimentos cautelares no seguro desse tipo de operações.
O custo do seguro aumentará com certeza. O setor nem tem ainda noção de quanto esse desastre lhe custará.
É bom lembrar que as empresas de seguros e resseguros já estavam muito pressionadas por causa da série de terremotos que aconteceu este ano, alguns no EUA, onde a maior parte das propriedades é segurada. O presidente da Associação de Seguros do Caribe, Desmond Camacho, abriu a 30ª Conferência de Seguros do Caribe, dizendo que “nós ainda não sabemos o que isso significará para nós e para esta região e certamente todos ao longo da costa serão afetados”. Ele disse, ainda, que em consequência desses eventos “nós estamos vendo que o tom da regulação se tornou muito mais restritivo, muito menos tolerante e demandará muito mais de nós em termos de governança e estruturas apropriadas”, particularmente para evitar uma debacle financeira.
Esse é o tipo do desastre que não cai no esquecimento, porque suas consequências continuarão visíveis e provocarão perdas por anos a fio.
A exploração de petróleo em profundidade no mar sofrerá restrições regulatórias e enfrentará cláusulas de precaução, em várias frentes. No médio e longo prazo, aumentarão os desincentivos ao uso de combustíveis fósseis e os incentivos à energia renovável limpa. Os programas de pesquisa e desenvolvimento em novas energias serão acelerados. A adoção de veículos elétricos e híbridos também.
Esse é um evento que acelera uma transição que já está determinada pelas condições físicas decorrentes da mudança climática. Acelera porque afeta o processo político, mais lento, que não tem acompanhado o crescimento das restrições físicas às emissões de gases estufa e à poluição. A adoção de padrões de baixo carbono é um imperativo inarredável.
O que se discute é o tempo que isso levará e, em consequência, os seus custos econômicos, climáticos e ambientais.

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